Como Os Contínuos Mentais Se Perpetuam

Os Contínuos Permanecem na Mesma Categoria dos Fenômenos 

Vamos examinar a natureza dos contínuos, já que entender isso é crucial para entender o ensinamento budista sobre o renascimento. 

Uma das principais qualidades de um contínuo é que, qualquer que seja a categoria de fenômenos que têm uma sucessão de momentos, eles continuam a ser a mesma categoria de fenômenos durante toda a sucessão. O que significa isso? Vamos dar um exemplo. Podemos falar sobre um contínuo de algo físico – em outras palavras, um contínuo de matéria e energia. Uma semente pode se transformar em uma árvore, depois em outro momento pode ser madeira, depois uma mesa, depois fogo e calor, depois fumaça e cinzas. Assim, o contínuo permanece na mesma categoria de fenômeno: é sempre uma sucessão de momentos de alguma forma de matéria/energia. 

Mas tenham cuidado. As palavras que estamos usando aqui, mudar e transformar, não significam que há aqui algum tipo de partícula de matéria/energia que muda ou se transforma em vários estados, mas continua a ser o mesmo substrato estático por debaixo dessas transformações. Não é como um pedaço de barro sendo moldado repetidamente em diferentes formatos. Também não estamos dizendo que os mesmos átomos imutáveis ou as mesmas partículas subatômicas imutáveis estão sendo reorganizadas para formar a semente, a árvore, a madeira, a mesa, o fogo e as cinzas. Tampouco estamos afirmando que essas várias formas de matéria/energia são transformações de uma grande entidade estática: a soma total e imutável de toda a energia do universo. Lembrem-se da imagem dos momentos que vão mudando num filme que estamos vendo. Sempre estamos falando da sucessão de algo, mas sem que esse “algo” seja uma entidade básica que perdura. Por favor, reflitam sobre isso. É um ponto crucial. 

A mesma análise aplica-se à sucessão de momentos de um vivenciar subjetivo e individual. O tipo de vivência muda de momento a momento, transforma-se em tipos diferentes, mas permanece basicamente na mesma categoria de fenômeno: uma forma de vivenciar algo. Por exemplo, o interesse em algo, como em um programa de televisão, pode se transformar em atenção, e a atenção pode se transformar em irritação, e depois em tédio e cansaço, sonolência, dormir, sonhar, e assim por diante. O tipo de vivência muda de momento a momento, mas sempre permanece na mesma categoria de fenômeno. Continua sendo um vivenciar: ainda que, como no caso da sucessão de momentos de matéria/energia, não haja uma “coisa” estática subjacente, uma “mente” ou uma “consciência” que esteja assumindo um formato diferente a cada momento. Novamente, lembrem-se sempre da analogia do filme. 

No entanto, o ponto mais importante aqui é que nos momentos de sucessão de algo, esse “algo” não pode e não muda a categoria do tipo geral de fenômeno que é. A raiva não pode se transformar em uma mesa e a madeira não pode se transformar em raiva. O próximo momento da madeira não pode ser raiva. Estamos falando de categorias bem diferentes de fenômenos: matéria/energia de um lado e vivenciar algo subjetivamente do outro lado.

Na verdade, isso é bem profundo. Isso chama nossa atenção para o fato de que quando falamos sobre a mente estamos falando sobre algo bem diferente de coisas físicas. Significa que matéria e energia não podem se transformar em vivênciar. Isso é muito importante, porque a maioria dos cientistas acredita que quando o esperma e o óvulo, ou vários componentes bioquímicos se juntam, eles podem se transformar numa vida. O budismo diz de forma bem enfática que eles não se transformam em uma vida. Podemos olhar para isso no nível micro ou macro. 

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