Comentário sobre os “Oito Versos de Treinamento da Mente” – O Dalai Lama

Às vezes encontramos pessoas muito negativas, mal-agradecidas ou que gritam conosco. Mas se ficarmos chateados ou com raiva, perderemos a capacidade de ajudar. Através dos métodos de treinamento mental podemos mudar nossa atitude em relação a essas pessoas para, não só nos mantermos calmos, mas também sermos mais capazes de ajudar. Os “Oito Versos de Treinamento da Mente”, ou treinamento de atitude, de Geshe Langri Tangpa, da tradição Kadampa, explicam como treinarmos a mente com método e sabedoria, e assim mudarmos nossa atitude quando houver perigo de nos aborrecermos. Os primeiros sete versos dizem respeito ao método — nomeadamente gentileza amorosa e bodhichitta — e o oitavo diz respeito à sabedoria, ou consciência discriminativa.

Verso 1: Todos os Seres São Superiores a Joias Realizadoras de Desejos

Que eu sempre valorize os seres limitados, por considerá-los muito superiores à joias realizadoras de desejos no que diz respeito à conquista do objetivo supremo.

Nós, e todos os outros seres, queremos ser felizes e completamente livres de sofrimento. Nisso, somos exatamente iguais. Entretanto, cada um de nós é apenas uma pessoa enquanto os outros seres são infinitos em número.

Agora, existem duas atitudes a serem consideradas: cuidarmos egoisticamente apenas de nós mesmos ou cuidarmos dos outros. Cuidarmos apenas de nós mesmos nos deixa muito fechados. Achamos que somos extremamente importantes e passamos a desejar basicamente nossa própria felicidade e que as coisas deem certo para nós, apesar de não sabemos como fazer para que seja assim. O fato é que nunca conseguiremos ser felizes se agirmos pensando apenas em nós mesmos. Por outro lado, aqueles que preocupam-se com os outros consideram todos os demais seres como mais importantes que eles próprios e valorizam, acima de tudo, ajudar os outros. Agindo assim, eles acabam ficando felizes.

Por exemplo, políticos que se interessam genuinamente em ajudar ou servir as pessoas são lembrados com respeito na história, enquanto os que só exploram e fazem mal viram exemplos de pessoas execráveis. Agora, deixando de lado, por um momento, religião, vidas futuras e nirvana, mesmo na vida [material], as pessoas egoístas acabam criando repercussões negativas para si por conta de suas ações autocentradas. Por outro lado, pessoas como Madre Teresa, que dedicaram suas vidas e energia para ajudar altruisticamente os outros, os pobres e necessitados, são sempre lembradas com respeito por seu trabalho. As pessoas não têm nada de negativo para falar delas.

Este é o resultado de nos preocuparmos com os outros: queiramos ou não, até mesmo aqueles que não são nossos parentes hão de gostar de nós, ficarão felizes com nossa presença e terão sentimentos calorosos para conosco. No entanto, se formos o tipo de pessoa que só fala coisas boas na frente mas pelas costas fala mal, é claro que ninguém vai gostar da gente. Assim, até mesmo nesta vida, se tentarmos ajudar ao máximo e tivermos o mínimo possível de pensamentos egoístas, sentiremos muita felicidade.

Nossa vida não é muito longa; no máximo 100 anos. Se, durante a vida, tentamos ser gentis, tivermos um coração afetuoso e nos preocuparmos com o bem estar dos outros, além de sermos menos egoístas e raivosos, será maravilhoso, excelente. Isso é realmente a causa da felicidade. Se formos egoístas, sempre nos colocando em primeiro lugar, o resultado é que chegaremos por último. Mentalmente nos colocando por último, e os outros em primeiro, é a forma de chegarmos na frente. Portanto, não se preocupe com a próxima vida ou com o nirvana; essas coisas virão gradualmente. Se nesta vida permanecermos bons, afetuosos e não egoístas, seremos bons cidadãos do mundo.

Quer sejamos budistas, cristãos ou comunistas, é irrelevante; o importante é que enquanto formos seres humanos, precisamos ser bons seres humanos. Este é o ensinamento do budismo. Esta é a mensagem de todas as religiões do mundo, mas os ensinamentos budistas contém todos os métodos para erradicarmos o egoísmo e efetivarmos uma atitude de apreço aos demais. O maravilhoso texto de Shantideva, Engajando-se no Comportamento do Bodhisattva (O Caminho do Bodhisattva, Skt. Bodhicharyavatara), por exemplo, é muito útil para isso. Eu pratico de acordo com esse livro; é extremamente útil. Nossa mente é muito astuta, muito difícil de controlar. Mas, se nos esforçarmos constantemente e trabalharmos sem parar com lógica e análise cuidadosa, seremos capazes de controlar nossa mente e mudar para melhor.

Alguns psicólogos ocidentais dizem que não devemos reprimir a raiva, e sim expressá-la. Dizem, de fato, que devemos praticar raiva! Contudo, precisamos fazer uma importante distinção entre problemas mentais que precisam ser expressados e os que é melhor não expressarmos. Algumas vezes, podemos ser realmente injustiçados e está certo expressarmos nossos ressentimentos ao invés de deixá-los apodrecerem dentro de nós. Mas nunca é útil os expressarmos com raiva. Se alimentarmos emoções negativas perturbadoras, como a raiva, elas se tornarão parte de nossa personalidade. Cada vez que expressamos raiva, torna-se mais fácil expressarmos raiva. Fazemos isso cada vez mais, até nos tornarmos pessoas furiosas totalmente fora do controle. Assim, no que diz respeito a problemas mentais, é certamente apropriado expressarmos alguns, mas outros não.

No início, quando tentamos controlar as emoções perturbadoras, é difícil. No primeiro dia, na primeira semana, no primeiro mês, não conseguimos controlá-las. Mas, com esforço constante conseguimos gradualmente diminuir nossas negatividades. Não conseguimos progredir mentalmente tomando remédio ou outras substâncias químicas, o progresso mental depende de controlarmos nossa mente. Assim, vemos que se quisermos realizar nossos desejos, sejam eles provisórios ou definitivos, precisamos controlar a mente para não termos auto-apreço. Para isso, precisamos contar com as outras pessoas muito mais do que contamos com joias realizadoras de desejos. Ou seja, precisamos sempre apreciar os outros acima de tudo, porque esta atitude é o que realmente vai realizar nossos desejos.

Melhorar nossa mente e, de fato, fazer algo para ajudar os outros é muito importante. Se não tivermos uma motivação pura, não importa o que façamos, nada nos garantirá satisfação.

Portanto, a primeira coisa que precisamos fazer é cultivar uma motivação pura. Mas não precisamos esperar até a motivação se desenvolver completamente para ajudar os outros. Lógico, para ajudarmos da maneira mais eficiente possível, precisamos atingir a iluminação total de um buda. E mesmo para sermos capazes de ajudar de forma vasta e extensiva, precisamos ter atingir um dos níveis mentais (bhumi) de um arya bodhisattva — e precisamos ter cognição não conceitual da vacuidade e percepção extrassensorial. Todavia, são muitos os níveis de ajuda que podemos oferecer. Mesmo antes de atingirmos essas qualificações, podemos tentar agir como bodhisattvas. Mas, naturalmente, nossas ações serão menos eficazes que as deles.

Então, sem esperar até que estejamos totalmente qualificados, podemos gerar uma boa motivação e com isso tentar ajudar os outros da melhor forma que conseguirmos. Esta é uma abordagem mais equilibrada, e melhor do que simplesmente permanecer isolado em algum lugar meditando um pouco e fazendo algumas recitações. Claro, isso depende muito de cada pessoa. Se estivermos confiantes de que ficando em um lugar remoto podemos obter realizações depois de um certo período, aí é diferente. Talvez seja melhor passarmos metade do nosso tempo trabalhando ativamente e a outra metade praticando meditação.

Verso 2: Considere-se Menos que os Outros e Valorize-os Mais do que a Si Mesmo

Sempre que estiver na companhia de alguém, que eu me considere menos que todos os demais e, do fundo do meu coração, valorize-os mais do que a mim mesmo.

Não importa com quem estejamos, sempre pensamos coisas como “Sou mais forte que ele”, “sou mais bonita que ela”, “sou mais inteligente”, “sou mais rico”, “sou muito mais qualificado” e assim por diante. Geramos muito orgulho. Isso não é bom. Ao invés disso, precisamos permanecer sempre humildes. Mesmo quando estivermos ajudando e engajados em um trabalho social, não devemos ter a atitude altiva de grande protetor beneficiando os fracos. Isso também é orgulho. Precisamos nos engajar nessas atividades de forma muito humilde e pensar que estamos oferecendo nossos serviços às pessoas.

Quando nos comparamos com animais, por exemplo, podemos pensar “eu tenho um corpo humano” ou “eu sou um monge” ou “eu sou uma monja” e nos sentirmos muito superiores a eles. Por um lado, podemos pensar que por termos um corpo humano e estarmos praticando os ensinamentos do Buda somos muito melhores que os insetos. Mas por outro lado, podemos dizer que os insetos são muito inocentes e livres de malícia, enquanto nós frequentemente mentimos e somos falsos no o intuito de alcançar o que desejamos ou sermos considerados mais do que somos. Sob este ponto de vista, podemos dizer que somos muito piores que os insetos, que simplesmente vivem sua vida sem fingir coisa alguma. Esse é um método para treinarmos humildade.

Verso 3: Confrontar e Evitar Emoções Perturbadoras Com Métodos Enérgicos

O que quer que esteja fazendo, que eu sempre verifique meu fluxo mental, e no momento em que concepções ou emoções perturbadoras aparecerem, já que elas me debilitam, e aos outros, que eu as confronte e evite com métodos enérgicos.

Se investigarmos nossa mente nos momentos em que estivermos sendo muito egoístas, preocupando-nos tanto conosco mesmo a ponto de excluir os demais, veremos que a raiz desses comportamentos são as emoções destrutivas e as atitudes negativas. Uma vez que elas perturbam tanto nossa mente, precisamos aplicar um antídoto assim que percebermos que estamos nos deixando influenciar por elas.

O antídoto geral para todas as aflições mentais (emoções e atitudes perturbadoras) é a meditação na vacuidade; mas também existem antídotos específicos que nós, principiantes, podemos aplicar. Assim, para o apego, meditamos sobre a feiura; para a raiva, meditamos sobre o amor; para a ingenuidade, meditamos sobre a originação dependente; para muitos pensamentos perturbadores, meditamos na respiração e nos ventos-energia.

Desenvolvemos apego às coisas porque as vemos como muito atraentes. Tentar vê-las como não atraentes ou feias neutraliza o apego. Por exemplo, podemos desenvolver apego ao corpo de outra pessoa ao considerá-lo muito atraente. Porém, quando começamos a analisar esse apego, percebemos que está baseado apenas na visão da pele. Contudo, a natureza do corpo que parece bonito para nós é [a natureza] da carne, sangue, ossos, pele e assim por diante, que o compõe.

Agora, vamos analisar a pele humana: tome a sua, por exemplo. Se um pedaço dela sair e o colocarmos em uma prateleira por alguns dias, se tornará extremamente repulsivo. Essa é a natureza da pele. E todas as outras partes do corpo são a mesma coisa. Não existe beleza em um pedaço de carne humana. Quando vemos sangue, podemos até sentir medo, mas não apego. Até mesmo um rosto bonito, se for arranhado não terá mais nada de bonito. Portanto, a feiura é, de fato, a natureza do corpo humano. Ossos e esqueletos humanos também são repulsivos. O símbolo da caveira e ossos cruzados tem uma conotação muito negativa, não tem? É a assim que devemos analisar algo pelo qual sentimos muito apego, ou amor — usando a palavra amor no seu sentido negativo, que é de desejo e apego. Pense mais sobre o lado feio do objeto ou analise a natureza da pessoa ou coisa segundo este ponto de vista. Mesmo que isso não controle completamente o apego, ao menos o subjuga um pouco. É o propósito de se meditar sobre o aspecto feio das coisas, ou cultivar o hábito de olhar o lado feio das coisas. Existe um outro tipo de amor, ou gentileza amorosa, que não está baseado no raciocínio de que “tal pessoa é bonita e, por isso, sinto admiração e devo ser gentil com ela”. A base para o amor puro é, “Este é um ser vivo que quer felicidade, não quer sofrimento e tem o direito de ser feliz. Com base nisso, sinto amor e compaixão”. Esse tipo de amor é totalmente diferente do primeiro, que é baseado em ingenuidade e ignorância e não é nada saudável.

As razões para cultivar-se a gentileza amorosa são sólidas. Com o amor que é simplesmente apego, qualquer mudança mínima no objeto, como uma pequena mudança de atitude, faz com que nosso sentimento mude imediatamente. Isto porque nossa emoção é baseada em algo muito superficial. Tome, por exemplo, um casamento recente. Frequentemente, após algumas semanas, meses ou anos o casal se torna inimigo um do outro e acaba se divorciando. Eles se casaram sentindo amor profundo — ninguém escolhe casar por raiva — mas, depois de um curto período de tempo, tudo mudou. Por que? Porque a base do relacionamento era muito superficial, então uma pequena mudança em uma das pessoas causou uma mudança completa na atitude da outra

Precisamos pensar “A outra pessoa é um ser humano, assim como eu. Certamente quero felicidade, portanto, ela também deve querer. Como ser vivo, tenho direito à felicidade e pela mesma razão essa pessoa também tem”. Logo, não importa o quanto nossa visão da pessoa mude — de boa, para ruim, para feia — ela é basicamente o mesmo ser vivo. Assim, uma vez que a maior razão para a gentileza amorosa está sempre presente, nossos sentimentos em relação ao outro são absolutamente estáveis.

Obviamente, quando apreciamos estar com alguém a quem somos apegados ou quando apreciamos objetos aos quais somos apegados, sentimos um certo prazer. Mas, como disse Nagarjuna, em Guirlanda Preciosa (Skt. Ratnavali) (169),

Coçar dá muito prazer, mas mais prazeroso ainda é não ter coceira. Da mesma forma, satisfazer desejos mundanos é prazeroso, mas mais prazeroso ainda é não ter desejos.

O antídoto para a raiva, por outro lado, é a meditação no amor. A raiva é um estado muito rude e grosseiro da mente, que precisa ser amaciado com amor.

Já no caso da ingenuidade (ignorância), meditamos nos doze elos da originação dependente, começando pela falta de consciência ou ignorância e indo até o envelhecimento e morte. Em um nível mais sutil, podemos usar a originação dependente como razão para estabelecermos todos os fenômenos como sendo destituídos de existência verdadeira.

Verso 4: Considerar as Pessoas Cruéis Como Sendo um Tesouro de Joias

Sempre que vir seres instintivamente cruéis, dominados por negatividades e problemas sérios, que os valorize como difíceis de encontrar, como descobrir um tesouro de joias.

Ao encontrarmos alguém que por natureza é muito cruel, rude, nojento e desagradável, nossa reação usual é evitá-lo. Nessas situações, nossa preocupação amorosa com os outros está sujeita a diminuir. Ao invés de permitir que nosso amor enfraqueça, pensando como a pessoa é terrível, precisamos enxergá-la como um objeto especial de compaixão, e apreciá-la como se tivéssemos encontrado um tesouro precioso, muito difícil de encontrar.

Verso 5: Tomar a Derrota para Si e Oferecer a Vitória ao Outro

Quando, por inveja, me tratarem injustamente, com repreensões, insultos e mais, que eu aceite a derrota e lhes ofereça a vitória.

Se alguém nos insulta, abusa ou critica dizendo que somos incompetentes, que não sabemos nada, provavelmente ficaremos com raiva e contestaremos o que a pessoa disse. Precisamos tentar não reagir assim. Ao invés disso, devemos aceitar essas palavras duras com humildade e tolerância.

Apesar de termos de ser humildes e aceitar as palavras duras, devemos ao mesmo tempo ser realistas no que diz respeito às qualidades que possuímos. Mas precisamos entender a diferença entre a confiança em nossas habilidades e o orgulho. Precisamos ter confiança em nossas habilidades e boas qualidades, e usá-las corajosamente, mas sem ficarmos arrogantes e orgulhosos. Ser humilde não significa sentirmo-nos totalmente incompetentes e incapazes. Cultivamos a humildade como antídoto para a raiva, mas precisamos usar nossas boas qualidades ao máximo.

Idealmente, precisamos de muita coragem e força, mas não devemos nos vangloriar ou mostrar pra todo mundo. Quando necessário, reagimos à altura da situação e lutamos bravamente pelo o que é correto. Isso seria perfeito. Se não temos nenhuma dessas boas qualidades, mas saímos por aí nos vangloriando e, quando precisamos de coragem nos acovardamos, somos exatamente o oposto. Na primeira situação, a pessoa é muito corajosa mas não tem orgulho, na outra é muito orgulhosa mas não tem coragem.

No que diz respeito ao conselho de tomar para si a derrota e oferecer a vitória aos outros, precisamos entender a diferença entre as duas situações. Se, por um lado, estivermos obcecados com nosso bem estar, e nossa motivação for egoísta, precisamos aceitar a derrota e oferecer a vitória ao outro, mesmo que isso nos custe a vida. Mas, por outro lado, se a situação envolver o bem estar dos demais, precisamos trabalhar muito e lutar por seus direitos, e não aceitar a derrota de jeito algum. Afinal, um dos 26 votos secundários de bodhisattva é, em situações em que alguém esteja fazendo algo muito ruim, não abster-se de usar métodos enérgicos ou o que for necessário para freiar imediatamente as ações da pessoa, no caso de todos os métodos pacíficos terem falhado. Ou seja, se não agirmos energicamente quando formos capazes, teremos transgredido esse comprometimento.

Pode parecer que esse voto de bodhisattva e o quinto verso, que diz que devemos aceitar a derrota e oferecer a vitória ao outro, são contraditórios; mas não são. Os preceitos do bodhisattva lidam com uma situação na qual nossa principal preocupação é o bem estar do outros: se alguém estiver fazendo algo extremamente prejudicial e perigoso, é errado não tomar fortes medidas, caso seja necessário.

Hoje em dia, em sociedades muito competitivas, com frequência é necessário tomar medidas extremamente defensivas. No entanto, a motivação nesse caso não deve ser a preocupação egoísta, mas sim extensos sentimentos de amor e compaixão. Se agirmos com esses sentimentos, para evitar que se crie karma negativo, estaremos totalmente corretos.

Quanto a como identificar quando é necessário tomarmos ações enérgicas, é complicado. Quando consideramos tomar a derrota, temos que ver se oferecer a vitória aos outros vai beneficiá-los de forma definitiva ou apenas temporariamente. Também precisamos considerar o efeito da derrota em nossa capacidade de ajudar os outros no futuro. E é possível que, ao fazer algo que os prejudique agora, criemos uma grande quantidade de força positiva (mérito), o que nos possibilitará fazer coisas amplamente benéficas no longo prazo. Esse é também um fator que temos que levar em conta.

Conforme disse Shantideva em Engajando-se no Comportamento do Bodhisattva (V 83-84):

Devo praticar as atitudes de amplo alcance (seis perfeições), da generosidade e assim por diante, como progressivamente mais exaltadas. [Mas] nunca devo descartar a maior em favor da menor: Devo considerar o benefício aos outros como o mais importante.
Percebendo que é assim, devo sempre me esforçar para beneficiar os outros. O Compassivo que Vê Longe permitiu [ao bodhisattva] fazer aquilo que [aos outros] é proibido.

No texto Compêndio de Treinamentos (Skt. Shiksasamuccaya), Shatideva também fala que os benefícios de cometer uma ação normalmente proibida, porém feita com bodhichitta, são maiores que a negatividade de cometê-la sem essa motivação.

Apesar de ser extremamente importante, as vezes pode ser muito difícil enxergar o limite entre o que fazer e o que não fazer. Por isso, precisamos estudar o texto que explica essas coisas. Os textos menos elevados nos dirão que certas ações são proibidas; enquanto os mais elevados nos dirão que essas mesmas ações são permitidas. Quanto mais soubermos, mais fácil será decidirmos o que fazer em qualquer situação.

Verso 6: Ver as Pessoas Ingratas como Professores Sagrados

Mesmo que alguém que eu tenha ajudado, ou por quem tenha grandes expectativas, me prejudique de forma totalmente injusta, que eu o veja como um professor sagrado.

Normalmente, esperamos que as pessoas a quem ajudamos fiquem muito gratas; e se reagirem com ingratidão, provavelmente ficaremos com muita raiva. Em tais situações, não devemos ficar chateados, e sim praticar paciência. E mais, precisamos ver essas pessoas como professores que testam nossa paciência e, assim, tratá-los com respeito. Esse verso resume todos os ensinamentos sobre paciência do texto Engajando-se no Comportamento do Bodhisattva, de Shantideva. Existem muitos métodos para cultivarmos paciência. O conhecimento e a crença na lei do karma, por si geram paciência. Percebemos, “Esse sofrimento que estou vivenciando é minha total culpa, é o resultado de ações que cometi no passado. Uma vez que não é possível escapar da experiência do karma que está amadurecendo, tenho que suportá-lo. No entanto, se quiser evitar sofrimento futuro, posso cultivar atitudes construtivas, como a paciência. Ficar irritado ou com raiva só criará mais karma negativo, o que será causa de infortúnios futuros.” Esta é uma maneira de cultivarmos paciência.

Outra coisa que podemos fazer é meditar sobre a natureza de sofrimento do corpo: “Este corpo e mente são a base para todo tipo de sofrimento. É natural e esperado que deles surja sofrimento.” Esse tipo de percepção é muito útil para desenvolvermos paciência.

Podemos também lembrar o que disse Shantideva em Engajando-se no Comportamento do Bodhisattva (VI 10):

Se não pode ser remediado, por que ficar de mau humor? E se pode, por que ficar de mau humor?

Portanto, se houver uma maneira ou oportunidade de superarmos o sofrimento, não precisamos nos preocupar ou ficar de mau humor. Se não houver absolutamente nada que possamos fazer, ficarmos chateados ou de mau humor em nada nos ajudará. Isto é muito simples e muito claro.

Podemos também contemplar as desvantagens de ficar com raiva e as vantagens de praticar paciência. Somos seres humanos, e como tais, uma das nossas maiores qualidades é a capacidade de pensar e julgar. Se perdermos a paciência e ficarmos com raiva, perderemos a capacidade de julgar apropriadamente e, assim, perderemos um dos instrumentos mais poderosos que temos para resolver problemas: a sabedoria humana. Isso é algo que os animais não têm. Se perdermos a paciência e ficarmos irritados, estaremos danificando esse instrumento. Precisamos nos lembrar, então, que é muito melhor termos coragem e determinação, e enfrentarmos o sofrimento com paciência.

Verso 7: Tomar o Sofrimento dos Outros e Dar-lhes Felicidade

Enfim, que eu ofereça a todas as minhas mães, direta ou indiretamente, o que quer que as beneficie e lhes traga alegria; e, secretamente, tome para mim todos os seus problemas e infortúnios.

Isso refere-se à pratica do de tomar para si todo o sofrimento dos outros e dar-lhes toda nossa felicidade (tonglen), com a forte motivação de compaixão e amor.

Queremos felicidade e não queremos sofrimento, e podemos ver que todos os demais seres sentem o mesmo. Podemos ver que outros seres também são tomados pelo sofrimento, mas não sabem como livrar-se dele. Com base nisso, geramos a intenção de tomar todo seu sofrimento e karma negativo e rezar para que amadureça imediatamente em nós. Também é óbvio que os outros seres não possuem a felicidade que buscam e não sabem como encontrá-la. Portanto, sem traço algum de avareza, oferecemos a eles toda a nossa felicidade — nosso corpo, riqueza e força kármica positiva — e rezamos para que ela amadureça imediatamente neles.

Claro, é muito improvável que realmente sejamos capazes de tomar todo o sofrimento dos outros e dar-lhes nossa felicidade. Quando tal transferência entre seres ocorre, é o resultado de uma conexão kármica muito forte e contínua. No entanto, essa meditação é um meio muito poderoso de gerar coragem em nossa mente e, portanto, é uma prática muito benéfica.

No Treinamento da Mente em Sete Pontos, Geshe Chekawa diz, “Treine em dar e receber de forma alternada, seguindo o fluxo da respiração.” E aqui, Langri Tangpa diz que isso deve ser feito às escondidas, secretamente. Shantideva, em Engajando-se no Comportamento do Bodhisattva (VIII 120), diz:

Assim, qualquer um que deseje rapidamente dar uma direção segura a si e aos outros precisa praticar o mais sagrado dos segredos: trocar de lugar com eles.

A prática é chamada de “secreta” ou “escondida” porque não é apropriada para a mente de bodhisattvas principiantes: é algo para alguns poucos praticantes selecionados. Também em Engajando-se no Comportamento do Bodhisattva (VIII 126cd), Shantideva diz: “Sacrificando-me pelos objetivos dos outros, adquirirei todas as glórias.” Mas, em Guirlanda Preciosa (11) Nagarjuna diz, “A prática do dharma não é simplesmente atormentar o corpo”. Quando Shantideva diz que devemos sacrificar-nos, ou infligir-nos sofrimento, isso não significa que precisamos bater em nossa cabeça ou algo assim. O que ele quer dizer é que, quando pensamentos fortes de auto-apreço surgirem, precisamos debatê-los fortemente conosco mesmo e usar de métodos enérgicos para subjugá-los. Em outras palavras, a quem precisamos infligir sofrimento é à nossa mente de auto-apreço.

Precisamos distinguir claramente entre o “eu” que está totalmente obcecado com seu próprio bem estar e o “eu” que se iluminará. Existe uma diferença muito grande. Além disso, precisamos ver esse verso de Shantideva no contexto dos versos anteriores e posteriores.

O “eu” é discutido de muitas formas diferentes: existe o apego a um “eu” verdadeiramente existente; existe o auto-apreço em relação a um “eu”; existe o “eu” com o qual nos engajamos quando olhamos as coisas pelo ponto de vista dos outros e assim por diante. Precisamos ver a discussão sobre o self, o “eu”, em todos esses diferentes contextos.

Se realmente beneficiar os outros, se beneficiar nem que seja um único ser, é apropriado tomarmos para nós o sofrimento dos três planos da existência samsárica ou ir para um dos infernos, e precisamos desenvolver a coragem pra isso. A fim de atingirmos a iluminação para o benefício de todos os seres sencientes, precisamos ser felizes e estarmos dispostos a passar incontáveis eons no mais inferior dos reinos infernais, Avichi. Isso é o que significa tomar para si o sofrimento que aflige os outros.

O ponto é desenvolvermos coragem suficiente para estarmos dispostos a ir para um dos reinos infernais; mas isso não quer dizer que realmente precisemos ir. Quando Geshe Chekawa estava morrendo, de repente ele chamou seus discípulos e pediu que fizessem oferendas especiais, cerimônias e orações por ele, uma vez que sua prática não havia sido bem sucedida. Os discípulos ficaram transtornados, pensando que algo terrível estava prestes a acontecer. No entanto, o Geshe explicou que apesar de ter rezado durante toda sua vida para nascer nos infernos e beneficiar os outros, agora ele estava recebendo uma visão futura do que sucederia e vendo que nasceria em uma terra pura ao invés de um inferno, e por isso que estava aborrecido.

Da mesma forma, se desenvolvemos um desejo forte e sincero de renascer em reinos inferiores (reinos piores), para o benefício dos outros seres, geramos uma vasta quantidade de força positiva, que transforma-se no resultado oposto. É por isso que sempre digo, se for para sermos egoístas, que sejamos sabiamente egoístas. Egoísmo míope nos faz cair; enquanto o egoísmo sábio nos faz virar Budas. Isso é realmente sábio!

Infelizmente, o que acontece é que primeiro nos apegamos a nos tornarmos budas. Pelas escrituras, entendemos que para atingir o estado de buda precisamos de bodhichitta e sem ela não conseguimos nos iluminar. Relutantemente pensamos: “Quero me tornar um buda, portanto preciso praticar bodhichitta.” Na verdade, não estamos tão preocupados com bodhichitta quanto com atingirmos o estado de buda, o que está completamente errado. Precisamos fazer o oposto; esqueça a motivação egoísta e pense em como realmente ajudar os outros.

Se realmente formos para um reino infernal, não conseguiremos ajudar nem aos outros e nem a nós mesmos. Como podemos ajudar alguém? Não é apenas dando coisas materiais ou fazendo milagres, mas sim ensinando-lhes dharma. No entanto, primeiro precisamos estar qualificados para ensinar. No momento, não podemos explicar todo o caminho — todas as práticas e experiências pelas quais uma pessoa precisa passar, desde o primeiro até o último estágio, até a iluminação. Talvez possamos explicar alguns dos estágios iniciais pela nossa própria experiência, mas não muito mais que isso. Para sermos capazes de ajudar de forma mais extensiva, liderando-os durante todo o caminho para a iluminação, precisamos primeiro atingir a iluminação. Essa é a razão legítima para sentir que precisamos praticar bodhichitta. É totalmente diferente do costumeiro enfoque autocentrado com o qual, por conta de uma preocupação egoísta com a própria iluminação, pensamos nos outros e dedicamos nosso coração à bodhichitta simplesmente porque nos sentimos obrigados. Essa forma de fazer as coisas é completamente falsa, uma espécie de mentira.

Verso 8: Superar a Perturbação Causada pelos Oito Dharmas Mundanos ao Realizar a Natureza Ilusória de Todos os Fenômenos

Durante tudo isso, que minha mente permaneça isenta das máculas das concepções a respeito das oito coisas passageiras, e que eu entenda todos os fenômenos como uma ilusão, que eu me liberte da escravidão, sem nenhum apego.

Este verso lida com a consciência discriminativa, ou sabedoria. As práticas anteriores não devem ser maculadas por concepções a respeito das oito coisas transitórias da vida, os assim chamados “oito dharmas mundanos” — elogio ou crítica, ouvir boas ou más notícias, ganhos ou perdas, coisas indo bem ou indo mal.

Podemos nos referir a esses oito [dharmas mundanos] como branco, preto ou misturado. Quando sentimos empolgação ao experimentar os primeiros itens desses pares (elogio, boas notícias, ganhos e coisas indo bem), ou demasiada depressão ao experimentar os segundos (crítica, más notícias, perdas e coisas indo mal), e isso tem como causa o apego à felicidade desta vida, o auto-apreço e o apego a um “eu” verdadeiramente existente, dizemos que o dharma é preto. Quando não é causado pelo apego a esta vida mas pelas outras duas motivações dizemos que é misturado. E quando não é causado pelo apego a esta vida ou pelo o auto-apreço, mas somente pelo apego a um “eu” verdadeiramente existente, dizemos que é branco. Acho que não tem problema se eu explicar esse verso apenas do ponto de vista de quando as práticas dos primeiros sete versos são feitas sem serem maculadas pelas concepções com as quais nos apegamos a um “eu” verdadeiramente existente face às oito coisas transitórias da vida: elogio, crítica e assim por diante.

Como evitar macular nossa prática dessa forma? Reconhecendo que todos os fenômenos existentes são ilusórios e, portanto, não nos apegando a eles como sendo verdadeiramente existentes. Desta forma, nos libertamos da servidão desse tipo de apego.

Entretanto, precisamos que fique bem claro o que a palavra “ilusório” quer dizer aqui. A existência inerente (existência verdadeiramente estabelecida) aparece para nossa mente no aspecto dos diversos objetos, onde quer que se manifestem. Mas, na verdade, não existe existência inerente. Em outras palavras, a existência inerente aparece apesar de não haver existência inerente, portanto, essa existência é uma ilusão. Isso significa que apesar de todas as coisas existentes parecerem ter uma existência inerente, todos os fenômenos são destituídos desse modo impossível de existência.

Para entendermos isso, é necessária uma compreensão correta, firme e decisiva da vacuidade, a vacuidade das aparências manifestas. Primeiro precisamos constatar que todos os fenômenos são destituídos de uma existência encontrável e inerente (verdadeiramente estabelecida). A seguir, quando algo que tem essa natureza vazia parecer ter existência inerente, refutamos esse modo impossível de existência recordando-nos de nossa constatação anterior de total ausência de existência inerente. Quando juntamos essas duas abordagens — a aparência de uma existência inerente encontrável e sua vacuidade, conforme experimentada anteriormente — descobrimos a natureza ilusória de todos os fenômenos. Assim, a aparência de uma existência inerente encontrável é uma ilusão, e os fenômenos que aparecem como verdadeiramente existentes são meramente uma ilusão, pois parecem existir de uma maneira que não corresponde à realidade. Eles se estabelecem meramente pela originação dependente.

É muito difícil compreender como algo que não é encontrável, e cuja existência é estabelecida meramente por originação dependente, funciona. Se conseguimos perceber que a existência, tanto do agente como da ação, é estabelecida apenas por serem fenômenos que surgem na dependência uns dos outros, e que não há como existirem por si só, autoestabelecidos, a vacuidade aparecerá em termos de originação dependente. Isso é o que há de mais difícil de entender. Se percebermos corretamente essa forma de existir que não está baseada em uma natureza encontrável e autoestabelecida — em outras palavras, uma existência não inerente ou encontrável — a experiência dos objetos existentes torna-se óbvia. A existência estabelecida ou explicada por uma natureza encontrável é refutada pela lógica. A lógica nos convence de que não há como os fenômenos terem uma natureza encontrável que estabelece ou explica sua existência.

Entretanto, definitivamente os fenômenos existem, porque nossa experiência deles é válida. Então, como eles existem? Em outras palavras, o que estabelece ou explica sua existência? Sua existência é estabelecida ou explicada como surgindo meramente na dependência do poder dos nomes. Isso não quer dizer que os fenômenos não existam de forma alguma; nunca se disse que as coisas não existem. O que se diz é que a existência das coisas só pode ser estabelecida ou explicada na dependência de nomes. Esse é um ponto difícil; algo que só conseguimos entender aos poucos, com a experiência.

Primeiro precisamos analisar se as coisas têm ou não uma existência inerente. Isso significa analisar se sua existência é verdadeiramente estabelecida ou explicada por algo encontrável por si só, ou, de forma simplificada, se as coisas são realmente encontráveis ou não. Mas, na verdade, não conseguirmos encontrar nada que por si só estabeleça a existência das coisas. De fato, não conseguimos encontrar nada: nada é encontrável. No entanto, se dissermos que os fenômenos não existem de forma alguma, isso é um engano, porque nós experimentamos as coisas. Em outras palavras, apesar de não conseguirmos provar através da lógica que as coisas têm uma existência inerente e encontrável sabemos, através de nossa experiência, que elas existem. Assim, podemos concluir que as coisas existem.

Agora, se as coisas existem, só há duas formas pelas quais sua existência pode ser estabelecida: por si só, ou seja, por seu próprio poder, ou pelo poder de outros fatores — quer dizer, ou são completamente independentes ou surgem na dependência de outros fatores. Uma vez que a lógica refuta que a existência das coisas pode ser estabelecida independentemente, por seu próprio poder, a única forma possível de se estabelecer sua existência é na dependência de outros fatores.

De que as coisas dependem para que sua existência seja estabelecida ou explicada? Elas dependem de uma base para o rótulo e um conceito ou nome que as rotule ou nomeie. Se os fenômenos pudessem ser encontrados quando os procurássemos, seria porque sua existência é estabelecida pela sua própria natureza. Nesse caso, as escrituras Madhyamaka, que dizem que a existência das coisas não é estabelecida pela natureza delas, estariam erradas. No entanto, não conseguimos achar as coisas quando as procuramos: não conseguimos achar nada nelas que estabeleça sua existência. O que descobrimos, então, é que a existência dos fenômenos é estabelecida meramente pelo poder dos outros fatores, ou seja, pelo poder dos nomes.

Aqui, a palavra “meramente” indica que algo está sendo excluído. Mas, o que está sendo eliminado não é o nome em si, nem o que ele significa ou a que se refere, que é o objeto de uma cognição válida. Não estamos dizendo que nomes não significam nada ou não se referem a nada, e que os objetos aos quais os nomes se referem não são objetos de cognição válida. O que a palavra “meramente” exclui é a existência do fenômeno como algo além do poder dos nomes. A existência dos fenômenos é estabelecida meramente pelo poder dos nomes; mas nomes referem-se a algo, e aquilo a que eles se referem são os objetos de cognição válida.

Assim, a natureza verdadeira das coisas é que sua existência é estabelecida ou explicada meramente pelo poder dos nomes. Não existe outra alternativa, apenas o poder dos nomes. Mas isso não significa que não haja nada além de nomes. Os fenômenos existem: existem os objetos que são a referência para os nomes e existem os nomes. O que estabelece a existência dos objetos aos quais os nomes se referem? Sua existência também é estabelecida meramente pelo poder dos nomes. De acordo com a Prasangika Madhyamaka, a mais elevada e precisa visão, se for um objeto externo ou uma consciência interna, a situação é a mesma. A existência de ambos é estabelecida meramente pelo poder dos nomes; nenhum dos dois tem uma existência estabelecida de forma verdadeira e encontrável. A existência de pensamentos e conceitos é, da mesma forma, estabelecida meramente pelo poder dos nomes, o que também ocorre com a vacuidade, o Buda, o bem, o mal e a indiferença. A existência de todos os fenômenos, de tudo, é estabelecida apenas pelo poder dos nomes.

Quando dizemos “apenas nomes” isso exclui os objetos cuja existência não é estabelecida meramente pelo poder de seus nomes. Não existe outra forma de entendermos que “apenas nomes” signifique algo além disso. No entanto, consideremos uma pessoa real e uma pessoa fantasma. Elas são iguais, no sentido de que sua existência só pode ser estabelecida ou explicada meramente pelo poder de seu nome. Mas existe uma diferença entre as duas. O que quer que exista ou não exista pode ser mentalmente rotulado, e isso é tudo. Podemos rotular mentalmente “pessoa real” e “pessoa fantasma”. Mas no que diz respeito aos nomes, alguns nomes referem-se a coisas que existem e outros não. O nome “pessoa real” refere-se a algo que existe, enquanto o nome “pessoa fantasma” não se refere a algo existente — refere-se a algo que não existe.

Conclusão

Quando percebemos que pessoas que nos desafiam emocionalmente, e as palavras duras e o comportamento desagradável que dirigem a nós, são como uma ilusão, não projetamos nelas uma existência verdadeira e encontrável como pessoas execráveis, palavras terríveis ou comportamentos horríveis. Elas são destituídas dessa forma impossível de existência. Vendo como os conceitos e palavras, ou seja, os nomes, com os quais rotulamos e designamos essas pessoas afetam a forma como as consideramos, somos capazes de transformar nossa atitude em relação à elas, rotulando-as como joias realizadoras de desejos. Vendo-as assim, consideramos nosso encontro com elas uma oportunidade preciosa de desenvolvermos boas qualidades, como paciência e humildade.

Leia e escute o texto original “Oito Versos de Treinamento da Mente” de Langri Tangpa.

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