As Dez Perfeições no Teravada, Mahayana e Bon

Introdução

As dez atitudes de longo alcance (pha-rol-tu phyin-pa, Skt. Paramita, Pali: parami; perfeições) são encontradas nas tradições Teravada, Mahayana e Bon. Literalmente falando, são os estados mentais que levam os bodhisattvas para a margem oposta - ou seja, para a iluminação. Embora os shravakas (ouvintes dos ensinamentos do Buda, que buscam a libertação de um arhat) também possam desenvolver essas atitudes, a menos que elas estejam associadas a um ideal de bodhichitta, não são considerados "de longo alcance".

A versão Teravada dos Relatos das Vidas Anteriores (sKyes-rab, Skt. Jataka) do Buda, quando ele praticava como um bodhisattva, fala de dez atitudes de longo alcance. A versão Sarvastivada fala apenas de seis. Dentro do Mahayana, tanto os Sutras Prajnaparamita (Pha-rol-tu phyin-pa'i mdo; Sutras da Consciência Discriminativa de Longo Alcance, Sutras da Perfeição da Sabedoria) como o Sutra do Lótus Branco do Dharma Sagrado (Dam-pa'i chos pad-ma dkar-po zhes-bya-ba theg-pa chen-po'i mdo, Skt: Saddharmapundarika-nama Mahayana Sutra; O Sutra do Lótus) discutem apenas seis. O Sutra dos Dez Níveis da Mente do Bodhisattva (Sa bcu-pa'i mdo, Skt. Dashabhumikasutra), no entanto, lista dez e os correlaciona com os dez níveis mentais de um arya bodhisattva - um bodhisattva que atingiu a cognição não conceitual da vacuidade.

A tradição Bon também lista dez, mas as chama de "dez atitudes insuperáveis" (bla-na med-par phyin-pa). Elas aparecem em Uma Caverna de Tesouros (mDzod-phug), descoberto como um texto tesouro por Shenchen Luga (gShen-chen Klu-dga') no início do século XI.

Teravada

O Caminho da Purificação do início do século V de Buddhaghosa (Pali: Visuddhimagga) explica que, cultivando adequadamente as quatro atitudes imensuráveis - amor, compaixão, entusiasmo e equanimidade, os bodhisattvas desenvolvem automaticamente as dez atitudes de longo alcance.

[Veja: As Quatro Incomensuráveis nas Escolas Hinayana, Mahayana e Bon]

Em outras palavras, a base para as dez atitudes de longo alcance é (a) desejar que todos os outros sejam felizes e não sejam infelizes, estejam livres de inimizade, agressão e ansiedade, (b) desejar que estejam livres do sofrimento (c) ) regozijar-se em sua felicidade mais elevada e desejar que ela perdure; e (d) ser moderado em relação aos outros, no sentido de ajudar sem se envolver demais ou ser indiferente. Com base nisso, os bodhisattvas desenvolvem as dez atitudes de longo alcance na seguinte ordem:

  1. Generosidade (Pali: dana) - a atitude com a qual os bodhisattvas dão coisas materiais a todos os seres, para que eles possam ser felizes, sem investigar se merecem ou não.
  2. Autodisciplina ética (Pali: sila) - a atitude com a qual evitam prejudicar os outros, mantendo seus votos, livres de raiva ou má vontade, mesmo que outros os prejudiquem.
  3. Renúncia ao apego (Pali: nekkhama) - a atitude com a qual eles abandonam todo apego às posses mundanas, status social e até mesmo a seus corpos.
  4. Sabedoria ou consciência discriminativa (Pali: pañña) - a atitude com a qual eles entendem e discriminam entre o que é benéfico e o que é prejudicial aos outros.
  5. Perseverança (Pali: viriya) - a atitude com a qual eles constantemente e corajosamente se esforçam para ajudar os outros e para poder ajudar
  6. Paciência (Pali: khanti) - a atitude com a qual eles não ficam zangados com as falhas, erros ou ações cruéis dos outros.
  7. Palavra (Pali: sacca) - a atitude com a qual eles cumprem suas promessas, mesmo que suas vidas estejam em risco.
  8. Determinação (Pali: adhitthana) - a atitude de determinação com a qual eles nunca abandonam o que precisam fazer para beneficiar os outros
  9. Amor (Pali: metta) - a atitude com a qual eles trabalham para promover o bem-estar e a felicidade dos outros, mesmo quando isso exige sacrifício.
  10. Equanimidade (Pali: upekkha) - a atitude com a qual eles não esperam nada em troca de sua ajuda, sendo indiferentes ao prazer e à dor e a qualquer benefício ou dano que possam receber.

A tradição Teravada também aponta que cada uma das dez atitudes de longo alcance possui três níveis: comum, médio e o mais alto. Um exemplo da mais alta generosidade é um bodhisattva dando seu corpo para os outros comerem. Em uma vida anterior como lebre, quando um mendigo lhe pediu comida, o Buda se jogou no fogo para que o mendigo tivesse o que comer.

Mahayana

Em Engajando-se no Comportamento do Bodhisattva (sPyod-'jug, Skt. Bodhisattvacharyavatara, O Caminho do Bodhisattva), o mestre indiano do século VIII, Shantideva, explica em detalhes que as seis atitudes de longo alcance são os estados mentais, e não necessariamente as ações motivadas por eles. Por exemplo (V 9-10):

Se a perfeição da generosidade fosse erradicar a pobreza dos seres errantes, como os Guardiões da antiguidade poderiam tê-la aperfeiçoado, já que os seres errantes ainda passam fome? Diz-se que a perfeição do dar é através de uma mente que daria a todos o que é seu, juntamente com seus resultados; portanto, é a mente em si.

As dez atitudes de longo alcance explicadas na tradição Mahayana são:

  1. Generosidade (sbyin-pa, sânscrito: dana) - o impulso mental (sems-pa, sânscrito: cetana) que leva os bodhisattvas a desejarem dar aos outros tudo o que é deles: seu corpo, riqueza material e as raízes de suas ações construtivas. Dar essas "raízes" significa dedicar a força positiva de suas ações construtivas para o benefício de outros.
  2. Autodisciplina ética (tshul-khrims, sânscrito: shila) - o anseio mental que os leva a salvaguardar as ações de seu corpo, fala e mente. Esse anseio vem deles terem afastado suas mentes de qualquer desejo de causar danos aos outros e dos fatores mentais perturbadores e destrutivos que poderiam motivá-los a prejudicar os outros.
  3. Paciência (bzod-pa, sânscrito: kshanti) - o desejo mental que os leva a não se deixar perturbar por aqueles que causam dano e sofrimento. Com esse desejo, os bodhisattvas nunca ficam com raiva.
  4. Perseverança (brtson-'grus, sânscrito: virya) - o desejo mental que os leva a ter energia (spro-ba, sânscrito: utsaha) para serem construtivos. Com esse desejo, os bodhisattvas nunca ficam com preguiça.
  5. Concentração ou estabilidade mental (bsam-gtan, sânscrito: Dhyana, concentração) – concentração mental unifocada em algum objeto construtivo, sem distração. É um estado mental estável, livre não apenas da agitação e do embotamento, mas também da distração por alguma emoção perturbadora do plano dos desejos sensoriais (Reino do Desejo). Nos estados avançados de estabilidade mental, outros fatores mentais, como sentimentos de felicidade, também não distraem a mente.
  6. Sabedoria ou consciência discriminativa (shes-rab, sânscrito: Prajna, sabedoria) - o fator mental que faz as diferenciações corretas entre os fenômenos.
  7. Habilidade com os meios (thabs-mkhas, sânscrito: Upaya), a consciência discriminativa especial dos métodos internos mais eficazes e adequados para se incorporar os ensinamentos do Buda e os métodos externos mais eficazes e apropriados para amadurecer os seres limitados (tornando-os maduros para atingir a libertação e a iluminação).
  8. Oração de aspiração (smon-lam, sânscrito: pranidhana) - a aspiração de nunca se separar do ideal de bodhichitta em todas as vidas, e dar continuidade às suas atividades de longo alcance em benefício de todos os seres. Esse fator mental é uma consciência discriminativa especial sobre fenômenos aos quais devemos aspirar.
  9. Fortalecimento (stobs, sânscrito: Bala, força) - a consciência discriminativa especial empregada para expandir a consciência discriminativa e não deixá-la ser esmagada por fatores opositores, como o apego a alguma coisa. Existem dois tipos: (a) fortalecimento de longo alcance por meio da análise minuciosa (kun-brtags-pa'i stobs) e (b) fortalecimento de longo alcance por meio da meditação (estabilizadora) (bsgoms-pa'i stobs).
  10. Consciência profunda (ye-shes, sânscrito jnana) - a consciência discriminativa especial empregada para integrar de forma total à mente a característica definidora de todos os fenômenos como sendo a vacuidade. Com a plena integração, os bodhisattvas ganham consciência igual e simultânea das duas verdades sobre tudo: a verdade superficial (kun-rdzob bden-pa, sânscrito: samvrttisatya; verdade convencional) e verdade mais profunda (don-dam bden-pa, sânscrito: paramarthasatya; verdade absoluta).

Fica claro nas definições que as quatro últimas atitudes de longo alcance são divisões da sexta, a consciência discriminativa de longo alcance. Observe que a lista Mahayana não inclui as atitudes de longo alcance de renúncia do Teravada, que são: palavra, determinação, amor e equanimidade. O Mahayana adiciona estabilidade mental de longo alcance e as quatro divisões da consciência discriminativa, e altera a ordem das atitudes compartilhadas.

Bon

As dez atitudes insuperáveis na tradição Bon se assemelham às dez atitudes de longo alcance no Mahayana, mas com várias diferenças:

  1. Generosidade
  2. Autodisciplina ética
  3. Paciência
  4. Perseverança
  5. Concentração ou estabilidade mental
  6. Fortalecimento
  7. Compaixão
  8. Oração de aspiração
  9. Habilidade com os meios
  10. Sabedoria ou consciência discriminativa.

Observe a adição da compaixão de longo alcance, a mudança na ordem de várias atitudes e a omissão da consciência profunda de longo alcance.

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